30/10/2009
Para Roberto Gurgel, ordenamento jurídico já possui regras que garantem o uso moderado de algemas
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, encaminhou parecer ao Supremo Tribunal Federal (STF) opinando pelo cancelamento da Súmula Vinculante nº 11, editada pelo STF em agosto de 2008 para evitar o uso abusivo de algemas. A edição da súmula foi questionada pela Confederação Brasileira dos Trabalhadores Policiais Civis (Cobrapol).
A entidade alega que a súmula viola o príncipio da isonomia, “ao priorizar o resguardo do direito à imagem frente à liberdade de informação”, neglicenciando a segurança dos policiais. Afirma que não há como prever a reação de cada indíviduo e que o STF teria violado o princípio da separação dos Poderes e não observado um dos requisitos para a edição de súmulas, que é a reiteração de decisões da Corte em matéria constitucional.
Na ocasião da edição da súmula, o STF anulou a condenação de um réu porque o juiz autorizou a colocação de algemas durante o julgamento, sem que fosse apresentada justificativa suficiente para isso. Mas o texto estende a regulamentação a prisões cautelares e a outros atos processuais, como audiências.
O procurador-geral reconhece que o STF se preocupou em resguardar a dignidade das pessoas presas e que em diversas ocasiões houve abuso no uso das algemas, “em especial quando o preso ou investigado é agente político ou pessoa pública com reconhecido poder econômico, bem como quando se trata de crime com certa repercussão na imprensa falada e escrita.” Para Gurgel, o uso das algemas tem que ser regulamentado, até porque a utilização desnecessária e abusiva viola a Constituição Federal. Mas ele questiona se a súmula vinculante é o instrumento adequado para regulamentar a questão.
Roberto Gurgel entende que não há violação do princípio da separação dos Poderes, porque a Constituição permite, excepcionalmente, a edição de súmulas vinculantes em matéria penal ou processual penal que tenha sido constitucionalizada. No entanto, considera que o STF inovou o ordenamento jurídico, “ultrapassando, como destacou a entidade sindical proponente, os limites constitucionais de sua competência, uma vez que não pode atuar como legislador positivo”. Isso porque, até agosto de 2008, a única lei que tratava do assunto era a Lei de Execução Penal (Lei 7.210/84), que diz que o uso de algemas deverá ser disciplinado por decreto federal. Assim, a edição da súmula violaria um dos requisitos previstos no artigo 103-A, § 1º, da Constituição, sobre a existência de norma determinada acerca da qual haja controvérsia. “Conclui-se, portanto, que a súmula vinculante criou uma condição para o uso de algemas que não estava prevista na legislação ordinária”, explica Gurgel. Ele também defende que o uso de algemas, ainda que indevido, não pode implicar na nulidade dos atos processuais.
Além disso, o parecer considera que já existem, no ordenamento jurídico vigente, regras que garantem o uso moderado de algemas, inclusive com a punição do emprego abusivo. “Não há dúvida de que a utilização de algema como objetivo de expor a figura do preso ou investigado a situação vexatória é conduta reprovável, merecendo seu autor reprimenda, após a observância do devido processo legal.
Trata-se de hipótese de mera aplicação da legislação vigente”, defende.
O parecer vai ser analisado pela ministra Ellen Gracie, relatora do pedido.
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